terça-feira, outubro 29

O encantador de cães - Cesar Millan


A National Geographic submeteu ao Dr. Andrew 4 cassetes do programa "O encantador de cães" antes deste ir para o ar, para que fosse analisado e eles tivessem uma opinião acerca do mesmo. Está aqui a carta escrita pelo conceituado veterinário à National Geographic que como todos sabemos foi ignorada. O texto foi retirado na íntegra daqui!

Por Andrew Luescher, DVM, Veterinário especialista em Comportamento Canino
Clínica de Comportamento Animal
Universidade de Purdue


Eu revi as 4 cassetes enviadas para mim pela National Geographic. Agradeço a oportunidade de poder visioná-las antes do programa ser transmitido na televisão. Eu terei muito prazer em rever quaisquer programas que lidem com comportamento de animais domésticos e acredito que esta é uma das responsabilidades da nossa profissão.

Eu estou envolvido na formação contínua de treinadores de cães nos últimos 10 anos, primeiramente através do programa universitário “Como os cães aprendem” na Universidade de Guelph (Colégio Veterinário de Ontário) e posteriormente através do curso DOGS! na Universidade de Purdue. Como tal, estou bem ciente onde se situa o treino canino hoje em dia, e devo dizer que as técnicas usadas por Millan são ultrapassadas e inaceitáveis não só para a comunidade veterinária, mas também para muitos treinadores de cães. A primeira questão no que toca às cassetes enviadas que eu coloco é: O programa repetidamente avisa as pessoas para não tentarem aquelas técnicas em casa. Então qual é o porpósito deste show? Penso que temos que ser realistas: as pessoas vão tentar estas técnicas em casa, infelizmente para detrimento do seus animais.

As técnicas de Millan são quase exclusivamente baseadas em duas técnicas apenas. “Flooding” e castigo positivo. No “flooding” o animal é exposto ao estímuloa que lhe causam medo (ou agressão) e impedido de evitar e sair da situação, até que pare de ter uma reacção. Para usar um exemplo humano: aracnofobia, sera tratada, fechando um indivíduo num armário, libertando centenas de aranhas lá dentro e mantendo a porta fechada até que a pessoa parasse de reagir. A pessoa talvez se curasse com tal método, mas poderá também ficar severamente perturbada e terá sofrido uma grande quantidade de stress. “Flooding” tem, como tal, desde sempre sido considerado um método de tratamento cruel e que incorre muitos riscos.

Castigo positivo refere-se à aplicação de um estímulo aversivo ou correcção como consequência de um comportamento. Existem muitas preocupações acerca do uso do castigo, que vão para além do próprio desconforto do mesmo. 

Castigos são extremamente inapropriados para o tratamento da maioria de agressões e para o tratamento de qualquer comportamento que involva ansiedade. O castigo pode suprimir a maioria do comportamento, mas não resolve o problema que o originou, isto é, o medo ou a ansiedade. Mesmo em casos onde a aplicação do castigo é correcta, esta pode ser considerada inapropriada, muitas são as condições que têm que ser reunidas para que isto aconteceça, e que a maioria dos donos de cães não conseguem fazer. O castigo deverá ser aplicado cada vez que o comportamento é demonstrado, dentro de meio segundo do comportamento ser demonstrado e à intensidade correcta.
A maioria das explicações teóricas que Millan fornece como causas para os problemas comportamentais estão erradas. Nem um único destes cães tem um problema de dominância. Nem um só destes cães queria controlar a família. A única coisa na qual ele tem razão é que calma e consistência são extremamente importantes, mas estes factores não justificam os métodos presentemente usados por ele como apropriados ou justificáveis.


O último episódio (problema obsessivo compulsivo) é particularmente preocupante, porque este problema está directamente relacionado com um desiquilíbrio nos níveis e receptores neurotransmissores e é como tal uma condição médica. Seria apropriado tratar uma pessoa com um problema de obsessão-compulsiva através de castigos? Ou ter um leigo a tratar tais casos?

Eu e os meus colegas e um sem número de líderes na comunidade de treino canino temos trabalhado durante anos para eliminar precisamente tal crueldade, ineficácia (em termos de cura) e técnicas inapropriadas como as apresentadas neste programa.

Citado de http://caosciencia.blogspot.pt/2008/12/cesar-millan-toda-verdade.html.

Não duvido que Cesar Millan adora animais, especialmente cães, mas as técnicas que ele usa e mostra do seu programa " Encantador de Cães" são ultrapassadas. Os conceitos de "dominância" e de "cão alpha" estão um pouco desatualizados, o treino que Cesar impõe pode parecer ajudar os cães durante algum tempo, mas a longo prazo não resulta e leva a animais mais ansiosos. Devido à domesticação e evolução, os cães já não devem ser todos considerados animais de matilha, essa é uma natureza que dependerá do ambiente do animal. O cão sabe distinguir-nos como "não cão" e para combatermos problemas de dominância não devemos tornar-nos no alpha! Isso apenas irá piorar a situação. Nunca, em qualquer programa, o vi a usar um clicker, uma técnica de treino positivo adotada por milhares de pessoas, e provada como sendo uma técnica bastante útil e inofensiva. Cesar usar técnicas de castigo positivo demasiadas vezes - castigo positivo é definido por qualquer ação que faça com que o animal diminua a frequência de um comportamento, através da introdução de um estimulo. Os estímulos passam por gritar, bater, puxar a trela, bater com o pé, dizer NÃO, empurrar ligeiramente os membros posteriores (muitas vezes visto no programa- Cesar realiza um pequeno "kick" na região posterior do animal).
Ele realmente é capaz de ajudar alguns animais, mas a maioria das situações não é resolvida por completo. Cães assustados apenas são confrontados com o medo até deixarem de reagir, e a transição nem sempre é suave. Cesar já foi mordido algumas vezes no programa, provando que as suas técnicas são incorretas e levam a animais ainda mais ansiosos. Alguns dos casos necessitam de acompanhamento veterinário e farmacologia, mas Cesar parece achar que resolve tudo apenas sendo o alpha da matilha.






A teoria do "pack leader" não funciona porque:

- os cães não são lobos, organizam-me hierarquicamente em pequenos grupos, mas não formam grandes matilhas cuja objetivo é sobreviverem;
- o cão não nos inclui numa hierarquia;
- entre cães, a hierarquia é definida por sinais de dominância/submissão corporais e posturais que NÃO envolvem agressividade;
- a agressividade não está relacionada com dominância ou tentativa de subida na hierarquia: está sim associada a obtenção de recursos, a medos, ansiedade, fustração, mau treino, etc
- como nós somos o detentor de recursos, o cão aprende a respeitar-nos, e aprende que dados comportamentos levam a recompensas e outros não: somos o lider, mas não o ditador ou o dominante!
- a tentativa de dominarmos o cão pode levar a estados de ansiedade e ataques de pânico


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