sábado, novembro 2

A dominância - cão/lobo

Será que, lá por os cães descenderem dos lobos, teremos de olhar para ambos como iguais e aceitar que os comportamentos se repetem?  E será que, para que o nosso animal seja obediente e nos respeite, teremos de nos tornar no alpha? Segundo Cesar Millan, sim temos. Mas esses são termos ultrapassados e muitas vezes usados por adestradores que implementam o treino aversivo.



Os meus cães sabem que não sou um cão e sabem distinguir-me das outras espécies, portanto não me adianta tentar ser o alpha de uma matilha apenas existente na minha cabeça...Para o cão não fará qualquer sentido eu sair por uma porta primeiro, sentar-me primeiro, comer primeiro, etc... Isso poderá ser importante para que o cão seja respeitoso  mas não para que me veja como alpha.


O LOBO E O CÃO





O conceito de que devíamos ter uma organização social com os nossos cães baseada no estatuto hierárquico, exatamente como os Lobos, é errado. Para haver um equilíbrio na relação humano/cão é só necessária uma correta socialização na fase crítica do crescimento do cachorro, conhecimento da linguagem canina para que possamos interpretar os sinais emanados por estes e um consequente adestramento em obediência social, seguindo os princípios do condicionamento operante e sem recurso ao castigo físico. 


Tanto o cão, como o chacal como o coiote, numa dada altura do seu percurso afastaram-se do seu ancestral, o lobo e evoluíram noutras espécies totalmente distintas.  Ao longo da evolução dos cães como espécie autónoma, foram produzidas mudanças físicas que devemos considerar, como forma e tamanho do crânio, glândulas sudoríperas nas almofadas das patas (cães sim, lobos não), alteração do porte e colocação da cauda,  cios por ano, pelagem, movimentos e conformação geral. Durante o período de sociabilização Homem-Cão, é possível que o lobo tenha modificado muito pouco a sua estrutura física e mental, em contrapartida nós temos produzido, mediante uma combinação de factores naturais e de seleção, raças de todas as formas e tamanhos.
O lobo manteve o seu peso, tamanho e coloração do pêlo e não houve alterações pelo menos nos últimos 1000 anos. 






 
Porque é que não aproveitámos já há mais tempo as experiências feitas com os adestradores de golfinhos e baleias no início dos anos 60 do Século XX e que, devido aos excelentes resultados, vieram subsequentemente a serem prática comum nessa atividade? É consensual que nessas situações não se podia adestrar esses animais com base na subjugação e no medo uma vez que isso seria inconsequente devido a razões óbvias. Foi antes usado o clicker. Porque não em cães e gatos? A melhor técnica de aprendizagem é a do
 condicionamento operante.

O termo dominância encontra-se mal descrito e por isso gera bastante confusão e conflito. 

Segundo Roger Abrantes, a dominância pode ser descrita como um comportamento que é apresentado para eliminação da competência de outro membro do " grupo", de forma a se obterem recursos sem uso da força (sem lesões). É diferente de agressividade, pois esta é definida como um comportamento também com a finalidade de se obterem recursos, mas caracterizado pela existência de confronto físico para com membro fora do grupoEntende-se então que a dominância existe entre membros da matilha, e a agressividade ocorre entre animais não relacionados/animais que não convivem habitualmente.


A Matilha 

 ..."a hierarquia define-se como uma relação de dominância-submissão que se estabelece e se mantém através de comportamentos ritualizados”. 
Tendo em consideração que nós controlamos a maioria, se não todos os recursos dos nossos cães, incluindo se pode ou não procriar, a definição de dominância para o lobo - “um instinto condutor básico de sobrevivência canalizado para eliminar a competição de outro animal com quem coabita” - não se pode aplicar aos nossos cães.


As matilhas de lobos são criadas porque, em grupo, existem mais chances de sobrevivência, maior facilidade para encontrar alimento e maior facilidade para gerar descendência! É então do interesse destes animais, agruparem-me. Porém, mesmo dentro de um matilha de lobos hierarquizada, os comportamentos de agressividade são raros. Existem animais de status superior,  aqueles que acasalam entre si e que detêm maior capacidade para liderarem os restantes lobos -respeitam na mesma os restante membros e são os responsáveis por guiar a matilha.Costumam ser o animais mais velhos, porque a hierarquia tende a ser familiar. Mas atenção - esses lobos não andam sempre na frente para demonstrarem que são superiores (eles vão na frente no inicio de uma caçada, mas apenas para guiar o caminho, depois podem ficar para trás) nem comem primeiro (após obtenção de recursos cada um come por si, as interações ocorrem no momento de obtenção dos recursos).  
O status entre indivíduos e a dominância são conhecidos, não através de agressividade, mas sim através da demonstração de sinais de dominância e submissão formais, que são comportamentos, atitudes posturais e expressões faciais adotadas pelos animais. Estes sinais existem para que se evite o confronto e que este escale para demonstração de agressividade! A agressividade não é desejada, porque danifica o bom funcionamento da hierarquia. Numa hierarquia harmoniosa esses sinais e status são bem aceites, e há respeito mútuo entre os membros. Porém, se por algum motivo (recursos, cópula) existir a necessidade de luta por recursos ou cópula, algum dos animais terá de demonstrar dominância por agressividade, de forma a obter o que quer. Um animal que demonstre agressividade, dificilmente elevará o seu status, pois apenas demonstra que tem mau temperamento e que poderá prejudicar a matilha, então nunca será um bom "líder" ou defensor da matilha. Para além disso, entrar em conflito leva a gastos de energia necessária para a sobrevivência. Esse animal agressivo sabe disso, entende-se então que a agressividade apenas surgiu para a obtenção de recursos,  e não para elevação de status.

Numa matilha de lobos, o termo alpha deixou de ser usado para dar lugar aos termos "breeders" - breeders são machos e fêmeas que acasalam uns com os outros para gerarem descendência. Os restantes machos não procuram parceiras, e as restante fêmeas não manifestam cios, portanto são de um status inferior. Não se nota que exista um macho que coma primeira, ou um  macho que cace mais, portante não existe realmente um membro alpha, apenas um que poderá ter um papel maior na conduta da matilha e na sua perpetuação.

Então e o cão? 

Existe ainda um preconceito: que tudo o que os cães fazem é com o objectivo de dominar os humanos que com eles convivem e subirem na hierarquia. Errado.
Se isso acontecer é porque não foram socializados e não lhes foi devidamente comunicado que para se viver plenamente inserido numa sociedade só têm que se cumprir algumas regras e que não é necessário agir de forma agressiva para atingir os objetivos que nos cães são, fundamentalmente, a proteção dos recursos. Um cão que sobe para o sofá e se encosta à nossa almofada não está a ser dominante, apenas quer ir para lá! Se sempre lhe foi permitido ir para lá, é normal que a dada altura fique chateado se isso lhe for impedido!

Devemos lembrar-nos  que os cães e os lobos têm prioridades distintas! Numa matilha, os lobos devem assegurar a sua sobrevivência. O cão deixou de precisar de caçar para se alimentar, de procurar companheira/o para se reproduzir e de guardar para se proteger uma vez que o seu dono humano proporciona-lhe tudo isso - nós somos o detentor de recursos. Não há necessidade de se estabelecer uma hierarquia, porque as necessidades básicas de sobrevivência são facilmente obtidas através do dono.
Os lobos têm que aprender muito rapidamente as habilidades de caça para poderem sobreviver, enquanto um cão doméstico não necessita de aprender as técnicas de caçar e matar. Os cães podem gostar de viver em grupos, mas não têm a mesma necessidade de estabelecimento de hierarquia como os lobos - talvez em grupos de cães vadios isso seja mais marcado pela necessidade de sobrevivência, mas em cães "caseiros" isso não é notado.

Nós não estamos equipados com a mesma anatomia de um lobo ou de um cão para sermos capazes de comunicar com um cão a nossa posição. O cão da sociedade não necessita de nos incluir numa hierarquia. Apesar de existir a expressão “agressão por dominância” ela não implica que o cão tenha como objectivo elevar o seu estatuto.
“A intensificação de qualquer resposta agressiva por parte do cão é uma correção ou interrupção passiva ou ativa do seu comportamento”. Isto significa simplesmente que se um cão sofre de ansiedade devido à nossa atitude para com ele, pode tornar-se agressivo, mas não significa que seja agressiva para tentar subir na hierarquia. A Dra. Karen Overall redefiniu o termo como “controlo do impulso de agressão”
Os cães não são agressivos de forma impulsiva se possuírem um temperamento equilibrado, forem bem socializados e não sofrerem maus tratos.  “Não existem evidências de que este tipo de cães seja algo mais que uma variante de um cão normal, e não está associado a nenhum tipo de posto hierárquico artificial… nem existem evidências de que este tipo de cães tenha desenvolvido algum tipo de agressividade patológica”. 





Muitas expressões de agressividade canina que se encaixam no diagnóstico de agressão por dominância, têm como objectivo evitar algo que o cão entende como aversivo, mais do que tentar manter um status social. Como tal, 
um cão que esteja constantemente sob stress, se sinta ameaçado, ou que seja estimulado a ser agressivo, será agressivo.




Muitos definem a dominância nos nossos cães como a “proteção dos recursos”. Uma boa educação e controlo dos recursos evita cães agressivos. Não se pode esperar que se se impedir o acesso de um cão a um brinquedo ao qual sempre teve acesso  sem ter de "pedir", ele não fique importado ou tenta ripostar/responder! Nós é que o habituamos a isso... O importante é educar o animal desde cedo a esperar por qualquer interação, seja comer, brincar, saltar para o colo. Assim ele aprende a ser paciente e respeitador.

A Dra. Karen Overall disse que “a dominância é um conceito que encontramos na etologia tradicional e que faz referência à habilidade de um indivíduo em manter ou controlar o acesso a alguns recursos. Não devemos confundi-la com o status”. 


A agressão por dominância (ou o controlo do impulso agressivo) baseia-se em algumas formas de ansiedade. Em nenhum caso a agressão por dominância, nem a proteção dos recursos tem alguma coisa a ver com status. Se queremos classificar um cão como “dominante” a definição de “guardar os recursos” parece ser o conceito mais lógico quando consideramos que o que é verdadeiramente valioso par
a um cão: a comida, a água, um lugar para dormir, brincar com os brinquedos etc.

 agressão pode surgir devido a ansiedade, devido a medo, devido a dor/processo dolorosos, devido a confusão/angústia, etc.. Um com pode ver-se confuso se lhe for permitido exibir um comportamento numa situação, e se for punido pelo mesmo comportamento noutra situação. Ele pode passar a ser agressivo para se defender dessas situações ou por não saber como reagir

Organizando ideias: 
Mesmo entre lobos, agressividade por dominância é uma situação menos observada do que o que se pensava;
-Não devemos tornar-nos no alpha da matilha nem no membro dominante, mas sim no controlador de recursos, e isso deve ser conseguido de forma equilibrada: sejamos um bons lideres e não um bons ditadores!
- A agressividade pode estar relacionada com obtenção de recursos, como somos nós que os controlamos, o cão pode estar a ser agressivo por outro motivo qualquer (medo, ansiedade, etc);
- Os cães podem agrupar-se por hierarquias, mas não nos incluem nelas, e as demonstrações de agressividade não são para elevarem o status/hierarquia;
- De nada adianta comer primeiro que o cão, ou passar primeiro nas portas;
- Insistir na posição "alpha roll" em que rolamos o animal de costas e esperamos que mude o estado de espírito não faz sentido: em lobos o que ocorre é que o membro submisso mostra a sua posição expondo o abdómen e rolando, mas isso é da escolha do animal e não é forçado pelo "alfa";
O bom comportamento do animal deve ser sempre recompensado;
- Quanto ao mau comportamento, períodos de "ignorar o cão" demasiados prolongados podem levar a stress e ansiedade, o que realmente importa não é ignorar o cão por muito tempo quando chegamos a casa ou quando ele faz algo mau, mas sim não reforçar esse comportamento (isso é muitas vezes feito sem que nos apercebamos - reforço positivo ou negativo).
- Não devemos confundir o animal: se ele pode saltar para as nossas pernas, ele irá saltar para as pernas das outras pessoas - se não quisermos que ele o faça, e que fique agressivo se o impedirmos, não devemos permitir que o faça em nenhuma situação
- Grande parte de comportamentos indesejados ocorrem por mau uso de recompensas e de castigos
- Os cães sabem interpretar as nossas reações e posturas, entendem os termos de liderança e tendem a seguir e a exibir bom comportamento com donos calmos e firmes: devem aprender que o bom comportamento e respeito levam a recompensas


 

"The American Veterinary Society of Animal Behavior (AVSAB) has released new guidelines on the use of dominance theory in behavior modification of animals. The guidelines say, in part:
The AVSAB emphasizes that the standard of care for veterinarians specializing in behavior is that dominance theory should not be used as a general guide for behavior modification. Instead, the AVSAB emphasizes that behavior modification and training should focus on reinforcing desirable behaviors, avoiding the reinforcement of undesirable behaviors, and striving to address the underlying emotional state and motivations, including medical and genetic factors, that are driving the undesirable behavior.
AVSAB is concerned with the recent re-emergence of dominance theory and forcing dogs and other animals into submission as a means of preventing and correcting behavior problems. For decades, some traditional animal training has relied on dominance theory and has assumed that animals misbehave primarily because they are striving for higher rank. This idea often leads trainers to believe that force or coercion must be used to modify these undesirable behaviors.
In the last several decades, our understanding of dominance theory and of the behavior of domesticated animals and their wild counterparts has grown considerably, leading to updated views. To understand how and whether to apply dominance theory to behavior in animals, it’s imperative that one first has a basic understanding of the principles.
The full text of this guideline is available in the Articles section of ABRIonline.org here and also from the website of AVSAB www.AVSABonline.org"

Referências: 

http://www.streetdogrescue.com/aboutus/Pack_theory.pdf
http://igitur-archive.library.uu.nl/student-theses/2013-0116-200805/Scriptie_12-03_versie_def.pdf
http://comportamento-canino.blogspot.pt/
http://www.doglistener.co.uk/
http://avsabonline.org/uploads/position_statements/dominance_statement.pdf


quarta-feira, outubro 30

Condicionamento

Quando se fala em aprendizagem e adestramento, temos se nos referir também aos dois tipos de condicionamento conhecidos:

1) Condicionamento clássico/Pavloviano

Este condicionamento foi estudado por Ivan Petrovich Pavlov (1849) e ensina que através de várias experiências pelas quais o animal passa, ele vai aprender que dado estimulo estará associado a dada consequência, e isso irá marcar a sua resposta face ao estímulo inicial. A resposta reflexa do animal surgiu do emparelhamento entre um estimulo a um reflexo.

Para entender melhor refiro um exemplo clássico:

A um cão é apresentado o barulho de uma sirene - este é um estimulo neutro (NS) porque o animal ainda não associa a sirene a nada. Depois, após ouvir a sirene, é apresentada ao animal um tigela de comida - este é um estimulo incondicionado (US), porque gera uma resposta no animal em qualquer situação. Com o tempo, o animal vai associar a sirene (NS) à oferta de comida, ou seja vai aprender, e a sirene deixa de ser um estimulo neutro e passa a ser um estimulo condicionado (CS). Após esta aprendizagem o animal terá o reflexo de salivar e antecipar comida sempre que a sirene tocar e a resposta/reflexo do animal é condicionada por esses mesmo estímulos (CR).  A comida é um estimulo incondicionado porque gera resposta por si só, enquanto a sirene é um estimulo condicionado porque necessitou de ser associado a comida para gerar um reflexo no animal! O que acontece é que a resposta condicionada vai ser marcada e mesmo que o estimulo incondicionado (comida) não esteja presente, o animal vai continuar a associar a sirene a algo bom, e salivar na mesma.

Portanto, o condicionamento clássico faz com que os animais associem estímulos a reflexos e respostas devido à aprendizagem, e mesmo que não surja uma consequência após esse estimulo inicial, eles vão na mesma apresentar a mesma resposta.

Outro exemplo é a resposta de um cão ao toque da campainha. Antes o toque era um estimulo neutro, mas com o tempo o animal aprendeu que ele indicava a chegada de alguém a casa (estimulo incondicionado) e passou a exibir uma resposta face ao toque da campainha. A campainha passa enta o a ser um estimulo condicionado que gera uma resposta condicionada do animal - seja ela ladrar, ir para a janela, ir para a porta, etc - e mesmo que não entre ninguém na casa após toque da campainha, o animal vai exibir o mesmo comportamento, porque aprendeu a prever.

O condicionamento pavloviano também fala de respostas/reflexos incondicionadas, respostas biológicas do organismo face a estímulos incondicionados, ou seja estímulos que não necessitam de condicionamento para gerarem resposta - ereção peniana, piloereção, dor de barriga, etc.


2) Condicionamento operante: este é o tipo de condicionamento empregue no treino de animais. O animal, através de várias experiências, vai aprender que dadas ações ou comportamentos vão ter como consequência o aparecimento de algo bom ou mau, ou o desaparecimento de algo bom ou mau. Neste condicionamento o animal "elege" exibir ou reprimir um comportamento, por ter aprendido que comportamento x ou y gera dada consequência - o comportamento é influenciado.
No condicionamento clássico o animal aprender a associar um estimulo a um consequência e passa a exibir uma resposta ao estimulo. No condicionamento operante o animal aprende a associar dados comportamentos seus a dadas consequências, e esses comportamentos são reforçados ou reprimidos tendo em conta a consequência ( se é boa ou má).

Este condicionamento aplica-se ao comportamento para alcançar um objetivo, portanto o animal vai-se comportar se forma a obter aquilo que quer.

Dentro do condicionamento operante fala-se de reforço e castigo, positivo e negativo, ou seja são possiveis 4 tipos de condicionamento. 
Antes de mais, salientar que um reforço é algo que, quando aplicado, aumenta a frequência de uma comportamento, enquanto castigo é algo que, quando aplicado, diminui ou reprime um comportamento. Positivo diz sempre respeito a adicionar/dar algo ao animal, e negativo diz respeito a tirar algo ao animal. Ser positivo ou negativo não indica ser BOM ou MAU, indica sim ADICIONAR ou TIRAR.


Reforço positivo (R+): a frequência de um dado comportamento é aumentada devido à adição de algo bom/algo que o animal gosta perante esse comportamento.
Ex: Sempre que o animal sentar ele vai receber um biscoito --> é reforço porque o comportamento vai-se repetir (é reforçado), e é positivo porque estamos a dar algo para o conseguirmos.

Este reforço é muitas vezes feito sem que nos apercebamos: quando o cão ladra e lhe damos atenção, ele vai aprender que de cada vez que ladrar vai conseguir o que quer, e o comportamento é reforçado.






Reforço negativo (R-): a frequência do comportamento é aumentada devido à retirada de algo mau para o animal/algo que ele não goste face a esse comportamento.
Ex: Sempre que o animal ladrar a um carro, ele afasta-se --> é reforço porque o comportamento repete-se, e é negativo porque o estimulo indesejado é removido ( o carro).

Este reforço também é muitas vezes feito sem que nos apercebamos: no veterinário um gato fica agressivo quando o médico se aproxima, como consequência o médico afasta-se. O gato aprende que sempre que for agressivo o que ele não gosta vai desaparecer (retira-se algo mau).





Castigo positivo (C+): a frequência de um comportamento diminui devido à adição de um algo mau ou indesejável para o animal face a esse comportamento.
Ex: Sempre que o animal ladrar , ele leva um puxão na coleira --> é castigo porque o comportamento é reprimido, e é positivo porque adicionamos algo ao animal (puxão) para o conseguirmos.


Este castigo engloba tudo o que puder ser adicionado para diminuir um comportamento: palmadas, gritos, dizer NÃO, puxar a trela, coleiras de choques, coleiras de citronela, etc.
Deve ser usado com muito cuidado para não deixar o animais ansiosos ou com problemas de obediência.




Castigo negativo (C-): a frequência de um comportamento diminui devido à remoção de um algo bom ou desejável para o animal face a esse comportamento.
Ex: Sempre que o animal trincar as nossas mãos enquanto brinca, as mãos vão ser retiradas --> é castigo porque o comportamento é reprimido (o cão deixa de morder) e é negativo porque estamos a tirar algo ao animal para o conseguirmos, neste caso é algo que ele gosta (as mãos).




O conhecido Treino Positivo engloba o R+ e o C-, tem um nome um pouco ingrato porque o castigo é negativo, mas é o treino ideal. Entende-se que o R+ e o C- andem de mãos dadas, porque por ex:

Um castigo negativo ocorre também quando um animal está a ser demasiado possessivo com um brinquedo, e como consequência o brinquedo é-lhe retirado. Ele vai aprender a ser paciente. De cada vez que ele for paciente e entregar o brinquedo quando pedido, ele vai receber logo o brinquedo de seguida, e isso foi reforço positivo.

Assim sendo, ao castigo positivo está associado o reforço negativo. Sempre que o animal ladrar a trela vai ser puxada (C+), mas assim que o animal acalmar a trela volta a ficar solta, ou seja foi retirado o que o animal não gosta para que ele aprenda a comportar-se assim (R-).







Dessensibilização: processo responsável pela diminuição ou alteração de uma resposta a um dado estimulo. Por exemplo, um cão tem receio de aspiradores, a dessensibilização passa por habituar o animal à presença desse estimulo, mas deve ser feita de forma gradual e calma para não gerar ainda mais ansiedade ou medo! À dessensibilização associa-se frequentemente o contracondicionamento, que está relacionado com o condicionamento pavloviano. Passa por associarmos o estimulo que é negativo para o animal a algo positivo, como brincadeiras ou petiscos. Desta forma o animal passa a associar esse estimulo a algo bom, porque o condicionamento anterior é alterado - ao estimulo condicionado (aspirador) é associado um estimulo incondicionado (brincadeira/petiscos) levando a uma resposta condicionada diferente da anterior
(que era ter medo).





terça-feira, outubro 29

O encantador de cães - Cesar Millan


A National Geographic submeteu ao Dr. Andrew 4 cassetes do programa "O encantador de cães" antes deste ir para o ar, para que fosse analisado e eles tivessem uma opinião acerca do mesmo. Está aqui a carta escrita pelo conceituado veterinário à National Geographic que como todos sabemos foi ignorada. O texto foi retirado na íntegra daqui!

Por Andrew Luescher, DVM, Veterinário especialista em Comportamento Canino
Clínica de Comportamento Animal
Universidade de Purdue


Eu revi as 4 cassetes enviadas para mim pela National Geographic. Agradeço a oportunidade de poder visioná-las antes do programa ser transmitido na televisão. Eu terei muito prazer em rever quaisquer programas que lidem com comportamento de animais domésticos e acredito que esta é uma das responsabilidades da nossa profissão.

Eu estou envolvido na formação contínua de treinadores de cães nos últimos 10 anos, primeiramente através do programa universitário “Como os cães aprendem” na Universidade de Guelph (Colégio Veterinário de Ontário) e posteriormente através do curso DOGS! na Universidade de Purdue. Como tal, estou bem ciente onde se situa o treino canino hoje em dia, e devo dizer que as técnicas usadas por Millan são ultrapassadas e inaceitáveis não só para a comunidade veterinária, mas também para muitos treinadores de cães. A primeira questão no que toca às cassetes enviadas que eu coloco é: O programa repetidamente avisa as pessoas para não tentarem aquelas técnicas em casa. Então qual é o porpósito deste show? Penso que temos que ser realistas: as pessoas vão tentar estas técnicas em casa, infelizmente para detrimento do seus animais.

As técnicas de Millan são quase exclusivamente baseadas em duas técnicas apenas. “Flooding” e castigo positivo. No “flooding” o animal é exposto ao estímuloa que lhe causam medo (ou agressão) e impedido de evitar e sair da situação, até que pare de ter uma reacção. Para usar um exemplo humano: aracnofobia, sera tratada, fechando um indivíduo num armário, libertando centenas de aranhas lá dentro e mantendo a porta fechada até que a pessoa parasse de reagir. A pessoa talvez se curasse com tal método, mas poderá também ficar severamente perturbada e terá sofrido uma grande quantidade de stress. “Flooding” tem, como tal, desde sempre sido considerado um método de tratamento cruel e que incorre muitos riscos.

Castigo positivo refere-se à aplicação de um estímulo aversivo ou correcção como consequência de um comportamento. Existem muitas preocupações acerca do uso do castigo, que vão para além do próprio desconforto do mesmo. 

Castigos são extremamente inapropriados para o tratamento da maioria de agressões e para o tratamento de qualquer comportamento que involva ansiedade. O castigo pode suprimir a maioria do comportamento, mas não resolve o problema que o originou, isto é, o medo ou a ansiedade. Mesmo em casos onde a aplicação do castigo é correcta, esta pode ser considerada inapropriada, muitas são as condições que têm que ser reunidas para que isto aconteceça, e que a maioria dos donos de cães não conseguem fazer. O castigo deverá ser aplicado cada vez que o comportamento é demonstrado, dentro de meio segundo do comportamento ser demonstrado e à intensidade correcta.
A maioria das explicações teóricas que Millan fornece como causas para os problemas comportamentais estão erradas. Nem um único destes cães tem um problema de dominância. Nem um só destes cães queria controlar a família. A única coisa na qual ele tem razão é que calma e consistência são extremamente importantes, mas estes factores não justificam os métodos presentemente usados por ele como apropriados ou justificáveis.


O último episódio (problema obsessivo compulsivo) é particularmente preocupante, porque este problema está directamente relacionado com um desiquilíbrio nos níveis e receptores neurotransmissores e é como tal uma condição médica. Seria apropriado tratar uma pessoa com um problema de obsessão-compulsiva através de castigos? Ou ter um leigo a tratar tais casos?

Eu e os meus colegas e um sem número de líderes na comunidade de treino canino temos trabalhado durante anos para eliminar precisamente tal crueldade, ineficácia (em termos de cura) e técnicas inapropriadas como as apresentadas neste programa.

Citado de http://caosciencia.blogspot.pt/2008/12/cesar-millan-toda-verdade.html.

Não duvido que Cesar Millan adora animais, especialmente cães, mas as técnicas que ele usa e mostra do seu programa " Encantador de Cães" são ultrapassadas. Os conceitos de "dominância" e de "cão alpha" estão um pouco desatualizados, o treino que Cesar impõe pode parecer ajudar os cães durante algum tempo, mas a longo prazo não resulta e leva a animais mais ansiosos. Devido à domesticação e evolução, os cães já não devem ser todos considerados animais de matilha, essa é uma natureza que dependerá do ambiente do animal. O cão sabe distinguir-nos como "não cão" e para combatermos problemas de dominância não devemos tornar-nos no alpha! Isso apenas irá piorar a situação. Nunca, em qualquer programa, o vi a usar um clicker, uma técnica de treino positivo adotada por milhares de pessoas, e provada como sendo uma técnica bastante útil e inofensiva. Cesar usar técnicas de castigo positivo demasiadas vezes - castigo positivo é definido por qualquer ação que faça com que o animal diminua a frequência de um comportamento, através da introdução de um estimulo. Os estímulos passam por gritar, bater, puxar a trela, bater com o pé, dizer NÃO, empurrar ligeiramente os membros posteriores (muitas vezes visto no programa- Cesar realiza um pequeno "kick" na região posterior do animal).
Ele realmente é capaz de ajudar alguns animais, mas a maioria das situações não é resolvida por completo. Cães assustados apenas são confrontados com o medo até deixarem de reagir, e a transição nem sempre é suave. Cesar já foi mordido algumas vezes no programa, provando que as suas técnicas são incorretas e levam a animais ainda mais ansiosos. Alguns dos casos necessitam de acompanhamento veterinário e farmacologia, mas Cesar parece achar que resolve tudo apenas sendo o alpha da matilha.






A teoria do "pack leader" não funciona porque:

- os cães não são lobos, organizam-me hierarquicamente em pequenos grupos, mas não formam grandes matilhas cuja objetivo é sobreviverem;
- o cão não nos inclui numa hierarquia;
- entre cães, a hierarquia é definida por sinais de dominância/submissão corporais e posturais que NÃO envolvem agressividade;
- a agressividade não está relacionada com dominância ou tentativa de subida na hierarquia: está sim associada a obtenção de recursos, a medos, ansiedade, fustração, mau treino, etc
- como nós somos o detentor de recursos, o cão aprende a respeitar-nos, e aprende que dados comportamentos levam a recompensas e outros não: somos o lider, mas não o ditador ou o dominante!
- a tentativa de dominarmos o cão pode levar a estados de ansiedade e ataques de pânico


quarta-feira, outubro 9

Avaliação de bem-estar em suínos e ruminantes


A avaliação do bem-estar (BE) passa pelo uso de indicadores que nos fornecem informação importante sobre o animal e o ambiente. Segundo Botreau et al, 2008 o BE passa por quatro princípios que se dividem em vários critérios:

1) Boa Alimentação
ausência de fome e sede
   
2) Boa Habitação
conforto geral
conforto térmico: desconforto térmico leva a alteração do comportamento normal do animal
capacidade e liberdade de movimento
recursos

3) Boa Saúde e Condição Corporal (CC)
ausência de lesões;
ausência de doenças;
 ausência de procedimentos dolorosos

4) Manifestação de Comportamento apropriado
expressão de comportamento social "normal"
expressão de outros comportamentos
boa relação Homem-animal
ausência de medo ou ansiedade
bom estado emocional



Vendo agora com mais pormenor alguns dos parâmetros:

SUINOS

1) Conforto térmico: como os suínos não suam, têm um pior sistema de controlo de temperatura. É por isso que são muitas vezes encontrados a rebolar na lama, fazem isso para se refrescarem. Ver muitos suínos sujos com lama e fezes pode ser indicador de stress térmico, e ambas as situações aumentam a incidência de infeções, que por sua vez agravam o mau-estar.
Má regulação da temperatura na exploração leva a aumento da mortalidade dos leitões devido a hipotermia (eles têm uma janela de temperatura ideal pequena, sendo essa diferente da janela da progenitora) - muito importante o uso de luzes ou tapetes térmicos.


Numa exploração de suinicultura deve-se então ter em atenção a ventilação e velocidade do ar, o tipo de pisos/solos (condutividade térmica) e tipos de jaulas/parques.
Perante temperaturas baixas na exploração, os suínos tendem a amontoarem-se para obtenção de calor, e tendem a dormir ou descansar em decúbito esternal. Suínos com calor tendem a dormir em decúbito lateral.

2) Liberdade de movimento: a sua falta deva a lutas entre os animais, aumento da agressividade e competição. Deve haver separação dos animais em lotes pequenos e um melhor desenho do plano da exploração.

3) Ausência de lesões: dependente da ausência de agressividade, sendo essa dependente da densidade populacional e da presença ou ausência de recursos para todos os animais.

Os leitões manifestam stress e confrontos após desmame, assim como menor ingestão alimentar. Isso leva a perdas produtivas devido à necessidade de mais 2 semanas para obtenção do peso ideal de abate. Ou seja, é também importante para o produtor certificar-se do bem-estar animal na sua exploração, nem que seja só por motivos económicos. Estas agressões podem ser evitadas através de enriquecimento ambiental, recursos para todos os animais, barreiras físicas e solo apropriado para descanso.

É possível uma seleção genética de animais menos agressivos, resultante em menores agressões entre leitões.

4) Procedimentos e maneio livres de sofrimento: a castração deve ser feita com recurso a anestesia e analgesia (pré/durante/pós procedimento).

5) Comportamento: o "tail biting" ocorre quando há pouca estimulação ambiental para os suínos, acabando eles por se virarem uns para os outros. Pode ocorrer também por stress térmico, grande densidade populacional, períodos de alimentação restritos/fome crónica e problemas com os bebedouros. Tudo isto se pode moldar através de enriquecimento ambientes e melhor planeamento do espaço e lotes.

Os comportamentos estereotipados mais frequentes são: roer de barras, ranger de dentes, enrolar da língua, mordeduras de bebedouros e lambeduras do chão.

6) Relação Homem-animal: evitar situações de pânico.



RUMINANTES

1) Alimentação: condição corporal; indicadores de fome e sede

- Importante oferecer bons comedouros e bebedouros: ter em atenção o número, o comprimento, a limpeza e a qualidade de água/alimento

2) Conforto durante o descanso: possibilidade para se deitarem e descansarem num bom espaço. s camas devem ser cômodas, espaçosas, limpas e secas.

Indicadores de falta de conforto:
- Alterações comportamentais;
- Claudicações: como não se deitam, acabam por andar mais;
-  Problemas posturais;
- Os bovinos levam cerca de 5 segundos para se deitarem (até que pousam os membros posteriores no chão/cama) um tempo mais demorado para o fazerem pode estar associado a má conformação das camas - devemos realizar videos e analisar todo a linha de tempo durante a qual a vaca se deita;
- Vaca apoia-se nas barras (cama pequena e desconfortável);
- Vaca deita-se parcialmente ou completamente fora da cama;
- Vaca sujas: porque não têm um local limpo para se deitaram - pode levar a mastites, que gera mais stress, mau-estar e dor;

3) Conforto térmico: associado a problemas produtivos e de bem-estar. Desconforto térmico leva a diminuição de produção leiteira, ruminação, fertilidade e depressão do sistema imunitário.
Uma vaca que dê 30L/dia de leite gera mais 50% de calor do que uma vaca seca.


Deve-se controlar bem a temperatura, a ventilação, a humidade e a densidade animal da exploração. É importante ter em conta o tipo de chão/sedimento, devido às suas capacidades de condutividade térmica. Ter em conta o fornecimento de área de sombra e bom área de movimento para cada animal.
Cuidado com vitelos, são muito sensíveis a baixas temperaturas! (animais com menos de 15 dias de idade e submetidos a temperaturas inferiores a 15ºC manifestam stress).

4) Procedimentos não dolorosos:

- Descorna e queimadura do bulbo: é importante para diminuição de agressividade entre animais, mas deve ser feita sem gerar dor aos mesmos.
- Corte de cauda: leva a stress porque o animal deixa de conseguir afastar os insetos com tanta facilidade; é um processo doloroso se não for certificado e não apresenta efeitos na redução da incidência de mastites.

5) Claudicações: causam dor, alteração do comportamento e da condição corporal (CC). Podem dever-se a laminites, má higiene de cascos, mau aparo de cascos, más condições do solo ( leva a quedas e lesões ou mesmo fraturas). A claudicação é avaliada em 5 níveis, dependendo do tipo de movimentação do animal e se o mesmo apoia o membro afetado ou não.

6) Comportamento social: existem hierarquias entre os animais, sendo que os inferiores comem menos e mais tarde (podem ficar mesmo sem comer), havendo diminuição da produtividade e do BEA.

7) Relação Homem-Animal: evitar situações de pânico e medo.




terça-feira, outubro 8

Avaliação de Bem-estar em Pequenos Animais

Deparamo-nos com questões sobre bem-estar de pequenos animais durante a prática clinica do dia-a-dia e também com situações caseiras. Será que ele sofre? Será que tem um estado emocional bem regulado? Para uma boa avaliação do bem-estar é preciso saber definir o que ele significa. Para uns o fato de um animal ter uma doença ou condição patológica já é suficiente para se dizer que há alteração no bem-estar porém, se a doença não causar dor, prurido, incômodo ou alteração do "normal" comportamento do animal, poderemos dizer que o seu bem-estar é afetado? É de considerar também a seguinte situação: o bem-estar do animal é mais afetado se ele for submetido a  procedimentos que visam a cura ou o maneio de uma doença  ou se o animal não for submetido a nada? Há procedimentos que são de tal forma agressivos que o mau-estar é demasiado, há então que ponderar se será melhor permitir a evolução de uma condição sem tentativa de cura, ou realizar eutanásia.

Segundo Fraser, 2008 o bem-estar pode ser avaliado por exploração dos seguintes parâmetros:

1) Bem-estar biológico/fisiológico

O básico: O animal não deve estar submetido a condições de sede, fome, má nutrição, desconforto térmico e físico, dor ou doença (ver abaixo indicadores).

Torna-se importante definir indicadores de mau-estar que nos ajudem a avaliar a condição do animal. 
Um dos melhores indicadores é a presença de doença, mas doença essa que cause dor, prurido, alteração no normal comportamento do animal, alteração do estado emocional e stresse/ansiedade.

Um doença multifatorial pode gerar elevados níveis de stress no animal, devido a alteração de muitas rotinas e comportamento, assim como frequentes idas ao vet ou procedimentos médicos. A condição de síndrome de disfunção cognitiva leva a perda de memória e predicabilidade, levando a alteração do estado emocional do animal. Afeções na pele são bons indicadores devido ao prurido, mas tanto podem mau-estar como ser fruto de mau-estar (autotomia, stress). A CIF (cistite idiopática felina) é normalmente associada a stress nos gatos e a ansiedade.

A nutrição é muito importante, mas põe-se em questão se animais obesos têm o bem-estar influenciado, porque se realmente não há desconforto nem alteração de comportamento, será que esse animal não está bem? Em animais cuja obesidade cause stress termal, impossibilidade de exercícios e osteoartrites já é mais seguro dizer que o bem-estar é afetado.

2) Bem-estar emocional - estados afetivos

O básico: O animal não deve estar submetido a condições de dor, medo, ansiedade, stress, aborrecimento, depressão, frustração, angústia,etc.

Um estado de stress é atingido quando todos os mecanismos de compensação e apaziguamento foram esgotados e também quando o estado emocional do animal é muito negativo e ele sofre. Isso gera consequências a nivel da saúde, reprodução, aprendizagem e interatividade.

3) Bem-estar comportamental

O básico: O animal não deve ser desprovido de possibilidades de exercícios, brincadeiras, bons contatos sociais e interações. 

O bem-estar é obtido através da capacidade para lidar com o ambiente, quando a adaptação não é possível é atingido um estado de stress e podem-se manifestar lesões. Isto está ainda mais presente em animal de zoo, em que o ambiente deve ser muito bem regulado e com estímulos suficientes para que o animal não desenvolva ansiedade ou comportamentos estereotipados.





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A nível de indicadores de mau-estar, existem os animais e os ambientais/recursos
Os indicadores animais são os mais usados, embora também seja importante a recolha de informação sobre o ambiente - os recursos ambientais não são iguais para todos os animais, uns têm mais importância e variam consoante preferencias individuais.

Indicadores animais:

- Falando em indicadores fisiológicos/biológicos: o cortisol (glucocorticoides) e a ACTH podem ser indicadores de stress  mas também estarem associados a emoções positivas e níveis elevados de excitação (importante distinguir); Nunca descartar mau-estar associados a doença ou afeção.

-Falando em indicadores comportamentais: temos todo o tipo de alterações de comportamento associadas a stress como anorexia, spraying, inibição do comportamento materno e menor exploração do ambiente, assim como comportamentos repetitivos ou compulsivos como os conhecidos estereótipos.
Estes estereótipos são indicadores de mau-estar óbvios, e são comportamentos repetitivos sem foco ou função óbvia, induzidos por frustração, tentativas de lidar com o ambiente falhadas (cope) ou disfunção cognitiva. Porém, a sua ausência são é indicativa da ausência de bem-estar, apenas a presença é que é indicativa de mau.
A simples alteração de um comportamento que o proprietário nos sabe dizer que era habitual, pode ser indicadora de mau-estar, mas deve ser feita uma análise profunda da situação. Atenção que os donos são maus avaliadores de bem-estar, mas podem-nos dar informações úteis sobre hábitos e rotinas.

Os indicadores ambientais incluem a presença/ausência de enriquecimento ambiental e a presença de novos estímulos positivos ou negativos, a existência de espaços de esconderijo para o animal (importante área de proteção onde ele se sente seguro), a existência de áreas "pessoais" e de recursos para cada animal (liteiras, tigelas, camas), e a consistência  de maneio animal (maneio inconsistente gera stress; maneio em fala ou demasia também).


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Na necessidade de avaliação de bem-estar de um animal poderemos estabelecer um método que nos permita cobrir todos os pontos importantes:

1)ID do animal: 

Base)

espécie

proveniência: foi um animal resgatado da rua? Foi obtido numa loja de animais ou num canil/gatil? - este parâmetro é importante para moldar a personalidade do animal

personalidade- como é normalmente;

vive sozinho ou com outros animais/colónias?

qual a relação com outros animais e com seres-humanos conhecidos e desconhecidos?

animal é reprodutor? é castrado?

exame físico - estado hígido ou doença? dor ou prurido? 

sentidos? - cegueira pode gerar mau-estar, por exemplo

exames complementares e possível tratamento!

Atualidade) 

Há alterações comportamentais? Comportamentos indesejados?
Há alterações na rotina ou hábitos do animal?
Há supressão de comportamentos como grooming, caça, exploração do ambiente?


O proprietário pode não ser muito consistente para nos dar estas respostas...


2) ID do espaço/ambiente

Base)

Tipo de habitação- casa, prédio, roulote, etc
Presença ou ausência de enriquecimento ambiental
Recursos disponível- estão bem divididos por todos os animais?
Características do meio interno: há muito barulho? há coisas que assustam o animal? está sempre gente em casa? tem acesso ao exterior?
Características do meio externo: o que que o animal vê la fora? com o que pode interagir lá fora? há outros animais ou estimulos lá fora?
Qual o grau de interação dos donos com o animal?

Atualidade)

Houve mudança de casa? Mudança de mobília ou da disposição espacial das coisas?
Houve introdução de novos animais ou pessoas?
Houve mudanças no ambiente interno/externo notórias? - novo sistema de som, novos barulhos que se fazem ouvir, novo vizinho
Houve mudanças nos pertences do animal?
Houve mudança nos habitos do animal devido a mudanças do ambiente? - retirada ou ocupação de um espaço escondido que o animal gostava

É importante também ver se há alguma relação entre um alteração na vida do animal e o inicio de uma alteração comportamental.

E pronto, partindo daqui são muitas as perguntas que se podem fazer, e devemos organizarmo-nos para podermos obter o máximo de informação possível do proprietário. É importante ensina-lo a interpretar o seu animal, para que ele nos saiba dizer o que é "normal" ou não no seu animal. Esta anamnese deve ser suave para evitar assustar o proprietário, ele deve-se sentir confortável para nos contar tudo. 

Para além da anamnese podemos ainda usar questionários mais padronizados e indicadores, obter informação de vets anteriores que possam ter acompanhado o animal, usar videos para observar o animal e perguntar sobre o animal a outras pessoas que o conheçam, que não o dono.





sexta-feira, outubro 4

Ansiedade por separação

Ansiedade por separação é uma condição que resulta de alteração da natureza fisica e comportamental do animal, gerando angústia quando o dono deixa o animal sozinho.

O animal tende a demonstrar muita ansiedade, ptialismo, vocalização, destruição do espaço em que se encontra, eliminação inapropriada e autotomia. O pico de angústia tende a ocorrer 15/20m após a ausência do proprietário, mas há animais que já demonstram sinais desta condição logo que reconhecem que o dono vai sair de casa.

Abordagem: Devemos providenciar proteção do animal e do ambiente envolvente.

- Habituação: o proprietário deve realizar o seu normal ritual de saída de casa (pegar nas chaves, vestir o casaco, descer as escadas, etc) mas depois ignora o animal, volta a pousar as coisas e a sentar-se no sofá ou à divisão da casa em que se encontrava. Este exercicio deve ser repetido 2-5x por dia. Serve para que o animal não associe sempre o ritual de saída à propria saida, e que os niveis de ansiedade baixem. Outra alternativa seria alterar o ritual de saida.

- Pedir para que o animal se sente e espere à porta de casa (dentro), o proprietário deve afastar-se uns poucos metros e por pouco tempo, depois volta a recompensa o animal. Este exercicio vai sendo repetido à medida que a distância e o tempo de ausência aumentam, até que o dono sai mesmo de casa e demora algum tempo. Recompensar sempre o animal pelo bom comportamento.

-20-30 minutos antes de sair de casa e após chegar a casa o dono deve ignorar o animal ou então dar-lhe pouca atenção, evitando excitar o mesmo;

- Enriquecimento ambiental para que o animal se distraia durante a ausência do dono;

- Fármacos contra a ansiedade: fluoxetina, clomipramina, amitriptilina e alprazolam

- Algo que poderá ajudar é a utilização da ThunderShirt, uma camisola para cães que abraça o corpo produzindo maior sensação de segurança e calma. Ver http://www.thundershirt.com/

- Coleira anti-ansiedade Adaptil

- Coleiras contra o latido NÃO RESULTAM

Sindrome de disfunção cognitiva

Síndrome de disfunção cognitivo (SDC) é uma condição que afeta animais idosos devido a uma patologia cerebral que causa perda de atenção, perda de memória e de capacidade de aprendizagem, assim como perda de percepção do ambiente envolvente. Esta condição não afeta todos os animal geriátricos
A alterações encefálicas características fazem com que a SDC nos animais de companhia seja posta ao mesmo nivel que Alzheimer no ser humano. Há perda de volume de massa encefálica, assim como perda de celularidade; ocorre degenerescência da substancia branca; fibrose e calcificação das meninges; dilatação dos ventrículos; diminuição do aporte de sangue, oxigénio e glicose ao cérebro. É caracteristica também uma diminuição de neurotransmissores e da sua ação- norepinefrina, acetilcolina, dopamina, seratonina, glutamina e colina, assim como deposição de placas beta-amiloides no cortéx cerebral e hipocampo.

Animais com esta condição apresenta uma  variedade de sintomas, sintetizados pela sigla DISHAAL










D - Disorientation: o animal vagueia pela casa como se procura-se algo; olha para um ponta distante ou uma parede durante muito tempo; apresenta alteração nas respostas a estimulos auditivos;
I - Interactions: o animal deixa de reconhecer os proprietários e outros animais ; deixa de interagir tanto com os donos e outros animais; cães que eram agressivos para estranhos tornam-se agressivos para com os donos; gatos que se encondiam de estranhos escondem-se agora dos donos;
S- Sleep Awake: horários de sono alterados; animal tendo a ter maior atividade e a vocalizar mais durante a noite, dormindo a maior parte do dia;
H- Housesoiling: o animal deixa de realizar as necessidades no local ensinado, e passa a fazer as necessidades pela casa;
A- Activity: niveis de atividades alterados na frequência e na intensidade; brinca menos ou até nada; encontra-se apático e deprimido; menor cuido pessoal;
A- Anxiety: animal fica muito mais ansioso e amedrontado, podendo demonstrar reações vistas como " anormais" pelo proprietário;
L- Learning and memory:  perda de noções básicas de obediência; eliminação inadequada; incapacidade de aprender algo novo


Os animais podem também manifestar diminuição do apetite.

 A nivel de ressonância magnética, num corte sagital do encéfalo é visível uma diminuição da espessura da adesão intertalâmica, devido à dilatação do 3º ventriculo. Devem ser selecionadas duas imagens, uma representativa da derivação T1 e outra de T2.  A média dos dois resultados é indicativo de fases de SDC. O normal seria um valor a rondar os 8mm, mas animais com SDC apresentam resultados de 5mm e até valores inferiores.



Tratamento

-Selegilina (inibidor seletivo irreversível das MAO-B)
A enzima monoamina oxidade B (MAO-B) metaboliza monoaminas (mais dopamina), a Selegilina inibe as MAO permitindo uma maior concentração sináptica de dopamina e feniletilamina.
Não cura a doença, apenas atrasa a sua progressão. Não associar a inibidores seletivos da recaptação de serotonina, a antridepressivos triciclicos e azapironas. Pode gerar alterações gastrointestinais, desorientação e declinio auditivo; 1-2 meses para se observarem resultados

- Melatonina: dar 30m antes da hora de dormir;

-Difenidramina, buspirona, benzodiazepinas, fenobarbital

- Alimentação rica em oxidantes: dieta b/d hills e j/d hills para cão e gato respetivamente;

-Reeducação de competências básicas, como uso de caixa de areia ou do jardim;

-Aumentar os recursos da casa e evitar alterações bruscas no ambiente;

- Aumento do nº de passeios e brincadeiras

-Nunca castigar o animal;

- Enriquecimento ambiental e brinquedos que estimulem os sentidos e a exploração

Agressividade Canina

Existem vários tipos de agressividade, um bom diagnostico e diferenciação são imprescindíveis para se encontrar a melhor forma de tratamento.




 Cão potencial perigoso é aquele que, deviso às características de espécie e raça, propensão para comportamento agressivo, tamanho/conformação e potência de mandíbula são capazes de causarem lesão ou morte a outros animais ou seres humanos.






Agressividade por natureza territorial


Caracterizada por comportamento agressivo anormal constante, demonstrado em zona fixas ou áreas em andamento (carro) devido à aproximação de individuos que não demonstram ameça, mas são interpretados como tal pelo cão agressivo. Este comportamento pode ser dirigido a animais ou pessoas, e é mais intenso na presença de vedações, muros, janelas e tudo aquilo que constituir uma barreira, aumento a confiança do animal e a sensação de território. Resulta de uma interpretação errada do contexto social e de ansiedade.

Afeta machos inteiros e fêmeas inteiras com cachorros. A castração SÓ resulta se o comportamento for territorial ou de patrulha..
Um cão que exiba sinais de incerteza/insegurança (piloereção, orelhas coladas, andar para a frente e voltar atrás) é considerado agressivo não só por questões territoriais, mas também por medo. A questão da dominância pode estar presenta.


Abordagem:

-Prevenção de situações;

-Modulação passiva  e ativa do comportamento: o animal deve aprender a ser respeitador e aprender comandos de obediência basica (ver acima);
- Coleira de citronela: liberta a substância sob a forma de esguicho quando o animal ladra, funcionando como castigo negativo;
- Uso de açaimes e coleiras de cabeça: aprender a lidar com estranhos e visitas;
- Controlo da ansiedade do agressor, e da vitima também se for necessário: fluoxetina, amitriplitina e clomiprina;


Agressividade por comportamento de proteção


Caracterizada por comportamento anormal continuo face à aproximação de um ou mais indivíduos que não representam ameaça, mas que são interpretados como tal. Pode estar relacionada com um pessoa, um bem, ou um territorio (natureza territorial).


Abordagem igual à anterior. Fármacos para agressor.


Agressividade para com outros cães


Agressividade constantemente direcionada para outros cães que não representam ameça. Resulta de ansiedade e má interpretação do contexto social.

Pode ser direcionada a cães desconhecidos: normalmente do mesmo sexo, conformação e tamanho; ou a cães conhecidos: resulta de um desafio lançado ao cão agressor (ou é interpretado dessa forma por ele), desafio esse que ele quer ganhar a todo o custo.

Abordagem:


-Prevenção de situações;
- Pode ser necessários separar os animais para proteção de ambos: apenas fechar o agressor e nunca a vitima, para não baixar o seu status social e ser uma vitima ainda mais vulnerável:
- Tentar reforçar o status do cão dominante para não haver disputas ou agressividade;
- Modulação passiva e ativa do comportamento (ver acima);
- Açaimes e coleiras de cabeça para modular comportamento e ensinar a conviver com outros cães, assim como passear - NO CÃO AGRESSOR, para baixar o status, a vitima não deve fugir ou ser removida!
- Interromper uma luta de forma verbal ou por distração. Se interrupção física for inevitável os cães devem ser puxados pelos membros posteriores e cauda;
- Controlo de ansiedade do agressor e da vitima: fluoxetina, clomipramina, amitriplitina e sertralina
- Castração de machos; Castração de fêmeas que sejam agressivas na gestação e durante o estro;

Agressividade por comportamento de predação


Agressividade silenciosa, que pode envolver comportamento de aproximação chão, ptialismo, contração da cauda e olhar fixo, com características de predação.
O alvo pode ser um animal pequeno e acessível, ou então seres humanos mais fracos como crianças ou idosos. Os cães atacam e realizam um mordidela forte seguida de sacudidela.


Abordagem:


-O cão e a vitima não devem ser separados, deve-se promover o convivio através de barreiras fisicas;

- Não punir fisica ou verbalmente;
- Açaimes e coleiras de cabeça;
- Não permitir que cão lamba as faces ou roube comida da mão, principalmente de crianças!;
- Controlo de ansiedade: fluoxetina, clomiprimina e amitriplitina ??